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23/09/2010 12:15 - Cartões: Quase três meses após abertura do mercado, varejo consegue baixar taxa

O cenário do balcão do lojista começa a mudar. A confusão de várias maquininhas de captura de transações com cartões (o POS) e um emaranhado de fios ocupando a área dos caixas, aos poucos, vai dando espaço a um ambiente mais organizado. Embora os sinais da ineficiência antiga ainda existam - com até 5 maquinetas num único estabelecimento! -, é cada vez mais comum ver um só POS recebendo as principais bandeiras. Quase três meses depois de ruir o duopólio da Cielo com a bandeira Visa e, por tabela, o da Redecard com a MasterCard, a briga pela preferência do lojista está polarizada entre as duas grandes credenciadoras e a presença do novo competidor, o Santander/GetNet, é ainda pouco percebida pelo próprio varejo.

 

Mesmo os pequenos, com um único ponto de venda, estão fazendo a sua escolha e conseguindo taxas menores por transação, descontos e até isenção da taxa de aluguel. É o caso do Le Salon, salão de beleza localizado em Perdizes, zona Oeste de São Paulo. A rapidez da Cielo em trocar o POS, há dois meses, foi a senha para a mudança, conta a sócia Lidiane Teixeira Gonçalves. "Assim que percebi que a nova máquina passava o Master, pedi para desabilitar a da Redecard." Isso a despeito de a Cielo cobrar o aluguel mais caro, de R$ 86,00 ao mês, enquanto na concorrente o aparelho saía a R$ 59,00. Na decisão pesou o fato de a Cielo ter oferecido um ano de isenção, enquanto a Redecard nem chegou a fazer proposta. A taxa por transação de débito vai cair de 2,5% para 2,4% e, no crédito, foi reduzida de 3,8% para 3,2%. "São mudanças pequenas, que fazem uma grande diferença no fim do mês."

 

Vislumbrando o aumento da competitividade entre as credenciadoras, que viria com a abertura do mercado, a partir de 1º de julho, a Arezzo antecipou as conversações com as operadoras já no fim do ano passado. O grupo, que tem 248 lojas franqueadas e 26 próprias, com faturamento de R$ 419 milhões no ano passado, acabou fechando acordo de preferência com a Cielo até dezembro. "Conseguimos reduzir as taxas de administração a níveis inferiores aos habituais 3% do mercado", diz o diretor de estratégia, Kurt Richter.

 

Antes do arranjo, cada lojista negociava sozinho com as redes de captura ou com a instituição financeira que oferecia conjuntamente o pacote de serviços bancários e as taxas variavam de 2,5% a 4% por transação de crédito, que contemplam 80% dos pagamentos. Nesse período de teste com a Cielo, o POS também saiu de graça, mas as máquinas da Redecard permanecem nos estabelecimentos por uma questão de contingência. Se uma falhar, a outra é acionada. Richter avisa, porém, que no fim do ano a Arezzo fará uma nova rodada de negociações, que, desta vez, pode incluir o Santander/GetNet. "A opção foi por não fazer um negócio de longo prazo, porque o mercado tem margem para reduzir ainda mais as taxas nos próximos anos; as credenciadoras querem ganhar ou defender market share."

 

Já a RGM Telecom, franqueada da Claro com oito lojas na região metropolitana de São Paulo, fechou exclusividade com a Redecard e já passa 100% do seu movimento pela rede, diz o sócio Marcos Sérgio Sandrini. O valor do POS caiu à metade, para R$ 39,00, mas ele não informa em que proporção as taxas de débito, crédito e parcelado foram reduzidas. Nessa escolha, ele levou em conta a política da Redecard de enxergar os diversos CNPJ como um único grupo, não impondo custos de um negócio inicial a cada nova loja aberta. "A Cielo, desde os tempos da VisaNet, sempre foi irredutível nesse sentido."

 

As grandes redes de varejo, por sua vez, que trabalham com o seus próprios terminais financeiros (o chamado TEF) e já não tinham o custo do aluguel do POS, também voltaram à mesa de negociações para brigar por taxas ainda menores. O que se comenta no mercado é que há casos em que estão conseguindo pagar menos de 1% por transação de crédito.

 

A rede de supermercados Ricoy, com 80 lojas espalhadas pela capital paulista e interior do Estado, conseguiu baixar as taxas pagas à Redecard e à Cielo. Há cerca de um mês, fechou um novo acordo com a Redecard, parceira antiga, e obteve redução de cerca de 30% nas tarifas das operações com cartões de crédito, conta o sócio Paulo Tadao Yokoi. Com a Cielo, também conseguiu preços menores, mas em percentual inferior ao negociado com a Redecard. Sem abrir os detalhes das duas negociações, o executivo só explica que a ordem, agora, é distribuir 80% das transações para a Redecard e 20% para a Cielo.

 

Com faturamento anual na casa dos R$ 700 milhões e mais de 140 lojas, a Eletroshopping, segunda maior varejista do Nordeste, aproveita o maior poder de barganha que o setor ganhou para chamar Cielo e Redecard para a conversa e espera bater o martelo até o fim do mês, segundo comenta o vice-presidente, Fernando Freitas. "Estamos examinando as duas propostas, podemos tanto ficar com uma só ou, dependendo da região, dividir a prestação do serviço."

 

Embora pelo volume que a rede movimenta já não pagasse as taxas mais salgadas, ele lembra que, antes, não havia escolha. "A Eletroshoping tinha que estar credenciada, não ia deixar de receber Master ou Visa, não podia ficar de fora. Só que a condição de negociação muda quando se tem a possibilidade de ficar com uma só rede de captura, dá para se definir algo melhor pelo acréscimo de volumes." Ele conta que o Santander/GetNet também chegou a fazer uma proposta, mas que na decisão vai considerar a combinação preço, tecnologia e a reciprocidade que já tem com Cielo e Redecard.

 

A Vivara, maior rede de joalheria do país, com 90 lojas, também está em fase final de negociação com Cielo e Redecard. Com volume de transações elevado e venda de produtos de alto tíquete médio, está colocando na mesa valores agregados que podem fazer diferença para a rede que tiver preferência, pondera o gerente financeiro, Rodrigo Domingues. A rede já trabalha com o TEF e, portanto, as conversas estão focadas nas taxas de desconto. Apesar de já ter relacionamento com o Santander, ele conta que o banco não chegou a oferecer proposta de adquirência. (Colaborou Mauro Arbex)

 

Cinco redes de captura, mas prestes a mudar

 

Cielo, Redecard, GetNet, Hipercard e American Express. Cinco maquininhas dividem a frente de caixa da SurfTrip, do shopping West Plaza, zona oeste de São Paulo. Com 10 lojas na capital paulista, Osasco e Suzano, esse estado de coisas está prestes a mudar. Apenas duas operadoras de cartões vão permanecer conectadas, conta o gerente administrativo-financeiro, Alberto Bastos. "Não fechamos ainda uma posição, porque cada uma (das credenciadoras) oferece um monte de coisa, desde que fique só com ela e isso é assustador." Na memória do executivo ainda estão as falhas da Redecard no Natal de 2009. "Se há demora na conexão, o consumidor simplesmente desiste da compra."

 

As propostas de Cielo e Redecard não diferem muito, diz. O valor do POS cairia à metade e as taxas de desconto passariam de 2% para 1,9% no crédito; de 4% para 3,5% ou 3,2% no parcelado, e, de 1,9% para 1,8% no débito. A ideia é ficar ou com Cielo ou com Redecard, mais a GetNet, que captura bandeiras menores. O Santander, por sua vez, só oferece um pacote mais vantajoso de adquirência se a SurfTrip abrir conta corrente no banco.

 

Com quatro lojas da revenda de cosméticos Mahogany, Claudio Pena espera a evolução das conversações do franqueador, que renegocia com as credenciadoras melhores preços para os 150 pontos de venda da marca. Por ora, ele vai permanecer com Cielo e Redecard, até por uma questão de contingência. O que o incomoda, porém, é que, na busca por um acordo de fidelização, o franqueador pede que os franqueados se unam a um determinado banco.

 

Toda essa movimentação não surpreende o presidente da Redecard, Roberto Medeiros. Ele diz que a área comercial tem se confrontado com três situações: lojistas optando por uma única rede, outros dividindo a captura com duas ou ainda transferindo a maior parte da movimentação para a Redecard, que premia o lojista pelo acréscimo de volumes. "O cliente, finalmente, tem alternativa de escolher." Sem adiantar números, ele fala que os resultados do terceiro trimestre vão refletir essa diversidade no processo decisório. "O mais importante é que, mês a mês, a gente continua adicionando dezenas de milhares de lojistas e a concorrência também, o mercado está crescendo."

 

Pelo tamanho de Cielo e Redecard, no conjunto com presença em mais de 1,5 milhão de estabelecimentos comerciais, a chegada do Santander/GetNet ainda é uma gota no oceano, reconhece o diretor da área de cartões, Cassius Schymura. Até junho, o banco tinha credenciado 52 mil lojistas. "Está num ritmo melhor do que o plano original e vamos atingir o objetivo de ter 10% de cota de mercado em três anos." Ele lembra que, enquanto as credenciadoras têm força comercial própria, o banco tem usado a sua rede de distribuição, com a oferta do pacote credenciamento e conta corrente, para clientes com faturamento anual de até R$ 30 milhões. (AC)

 

Impacto limitado para consumidor

 

A mobilização do varejo para conseguir taxas menores na captura de transações de crédito e débito pode se traduzir em vantagem limitada para o consumidor. No pequeno comércio, com margens apertadas, não se espera a redução de preços para os produtos e serviços prestados. Isso porque, embora os custos comecem a ficar menores, ainda consomem boa parte do faturamento. As taxas por transação de crédito, por exemplo, dependendo do porte, esbarram nos 4%. Já nas grandes redes, que chegam a pagar menos de 1% por transação, o discurso é outro. "Com certeza, vamos repassar a redução de custos aos preços dos produtos", diz Paulo Tadao Yokoi, sócio da rede de supermercados Ricoy.

 

No diagnóstico do Banco Central (BC) sobre o setor, a avaliação é de que a oferta de mais vantagem aos portador de cartões de crédito favorece a utilização da modalidade de pagamento. O custo do comerciante acaba sendo repassado a todos os consumidores, pelo fato de ele não poder diferenciar os preços pela forma de pagamento.

 

Renan Ferraciolli, da direção de fiscalização do Procon-SP, diz que qualquer diferenciação de preços ou estabelecimento de um valor mínimo para compras com cartões são práticas abusivas. "Nossa posição é de que todos os meios (de pagamento) são à vista e têm o mesmo tratamento." Ele vê com bons olhos as iniciativas que fomentam a concorrência no setor. "O ideal seria que as taxas menores fossem repassadas com a diminuição do valor final do produto." O impacto no bolso do consumidor, se houver, só será percebido ao longo do tempo, talvez quando o Santander/GetNet mostrar presença mais contundente.

 


Veículo: Valor Econômico

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