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03/12/2014 09:01 - Carne e lácteos viram alvos na Europa

Crescem as pressões na Europa para que os governos incitem a população a consumir menos carne vermelha e lácteos, com o argumento de atenuar o impacto da pecuária na mudança climática e também por razões de saúde.

 

 



O reputado "think tank" britânico Chatham House, the Royal Institute of International Affairs, publicou ontem relatório no qual destaca que, na média global por unidade de proteína, as emissões de gases de efeito estufa na produção de carne bovina são 150 vezes superiores às de produtos de soja, em volume. E que a produção de suínos e frango libera entre 20 e 25 vezes mais gases-estufa, responsáveis pelo aquecimento do planeta.

Para o instituto, considerando o aumento da produção e demanda global por proteínas, é improvável que a guinada na temperatura global seja mantida abaixo de 2 graus Celsius sem uma mudança no consumo global de carnes e lácteos.

A pecuária é a maior fonte global de metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), e provoca 14,5% de todas as emissões de efeito estufa globalmente, mais do que no setor de transportes. E a demanda por produtos animais cresce rapidamente. Até 2050, o consumo de carnes deve avançar 76% e o de lácteos, 65%, comparado a 2005-2007, enquanto o de cereais deve crescer 40%.

Atualmente, os maiores consumidores de carnes são China, União Europeia (UE), EUA e Brasil. Os maiores consumidores de lácteos são China, Índia, UE e EUA. Os dois países onde o consumo de carnes mais deve aumentar são China e o Brasil - com a diferença de que na China vai ser quatro vezes maior, em termos absolutos.

O relatório compara os poucos recursos para combater as emissões causadas pela pecuária aos enormes subsídios para a produção. Nos países ricos, os subsídios para a pecuária alcançaram US$ 53 bilhões em 2013. Só na UE, o montante da ajuda para a pecuária foi equivalente a US$ 190 por vaca. A China não fica atrás, com subsídios para suínos excedendo US$ 22 bilhões em 2012, equivalente a US$ 47 por animal.

Nas negociações internacionais sobre mudanças climáticas (UNFCCC), de oito dos 55 países que mencionaram a pecuária em seus planos nacionais de mitigação das emissões, apenas um, o Brasil, estabeleceu uma meta de redução quantitativa das redução de emissões nesse segmento.

No geral, porém, a constatação é de que o público desconhece o impacto do consumo de carnes. Ao mesmo tempo, governo e ambientalistas relutam em políticas ou campanhas incisivas para mudar o comportamento do consumidor.

O Chatham House fez uma ampla pesquisa em vários países para saber a atitude do público em relação ao consumo de carnes. Claramente, mudança climática não é uma consideração básica na escolha de alimentos. O consumidor coloca mais atenção no sabor, preço, saúde e segurança alimentar.

Para a entidade, o maior potencial para mudança no comportamento está nos emergentes. Pessoas que responderam à pesquisa no Brasil, China e Índia demonstraram maior aceitação do impacto de mudança climática e maior disposição para mudar seu comportamento do que a média dos países pesquisados. "Isso é encorajador, já que esses países estão entre os mais importantes para futura demanda por carnes e lácteos", diz o estudo.

Por sua vez, a Comissão Federal de Alimentos na Suíça alertou o governo que a carne vermelha pode ser perigosa para a saúde no longo prazo. Para a comissão, o governo deve aconselhar a população a moderar o consumo de carne vermelha não processada e ser ainda mais prudente no caso de salsichas e hambúrgueres. Diz-se basear em estudos recentes, indicando que os maiores consumidores de carne tem, num período de 13 anos, um risco de mortalidade 29% superior ao dos mais moderados. Riscos cardiovasculares, desenvolvimento de certos cânceres ou diabete do tipo 2 são citados.

Pecuaristas suíços reagiram imediatamente, pedindo para o governo renunciar a qualquer adaptação de política sobre carne. Alegam que o vínculo de causa e efeito entre consumo e saúde é pouco claro e sem base científica. Parlamentares liberais também mostram-se irritados. Dizem que a pessoa pode consumir o que bem entender, e lembram que a carne vermelha aporta proteínas e faz parte do equilíbrio alimentar.



Na pecuária brasileira, emissões ficaram estáveis em 2013

As emissões brasileiras de gases-estufa geradas pela pecuária mantiveram-se estagnadas no ano passado, permanecendo em 235,1 milhões de toneladas de CO2, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima.

Segundo Tasso Azevedo, coordenador do SEEG, a principal explicação para a manutenção está no fato de o rebanho bovino brasileiro praticamente não ter crescido entre um ano e outro. Seja por ajustes econômicos nos ciclos de abate, avanço da agricultura sobre áreas de pastagens ou maior produtividade do animal, o número de bovinos no país tem se mantido na casa de 210 milhões.

"O crescimento do rebanho desacelerou para 1,5% ao ano, ao passo que a produtividade subiu cerca de 2% a 3% ao ano", diz o estudo, divulgado recentemente. Com o rebanho controlado, portanto, suas emissões também ficam contidas.

Individualmente, a fermentação entérica do gado bovino responde pela maior parte das emissões do setor agropecuário brasileiro. Isso se deve ao tamanho do rebanho e ao fato de o boi ser um grande ruminante, dependendo da fermentação realizada por bactérias em seus estômagos para converter pasto em carne ou leite. Esse processo, porém, traz um custo ambiental: a fermentação produz o metano (CH4), o mais nocivo do grupo de gases que provocam o superaquecimento do planeta, e que é eliminado principalmente por meio de arrotos.

Maior rebanho, o gado bovino é também a maior fonte de metano entre os ruminantes criados no país. Em seguida vêm os rebanhos de ovelhas, cabras, búfalos, cavalos, suínos e demais herbívoros.

Segundo o Observatório do Clima, as emissões por fermentação se estabilizaram no Brasil desde meados da década passada, crescendo 2,2% entre 2005 e 2012, contra a alta de 6% nas emissões do setor agropecuário como um todo.

Se o arroto é um problema, os dejetos dos bois também preocupam. O esterco favorece a fermentação da matéria orgânica por bactérias na ausência de oxigênio, resultando na produção de metano e óxido nitroso (N2O). As grandes emissões no país são associadas ao tratamento de dejetos em tanques e lagoas.

No Brasil e demais países com grandes rebanhos de ruminantes, cientistas e empresas buscam formas de reduzir o estrago ambiental inerente a esses animais com novas fórmulas de alimentação e variedades de capim. Atividade física e mudanças no manejo do gado também podem contribuir com essa redução. No caso dos dejetos, há bom potencial de redução das emissões se esse metano for recuperado e utilizado como combustível.




Veículo: Valor Econômico

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