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22/10/2015 10:04 - Meta de inflação adiada

Com a economia em forte recessão, um quadro fiscal deteriorado e inflação em alta, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve, por unanimidade, os juros básicos em 14,25% ao ano e indicou, em comunicado, que não pretende mais atingir o centro da meta, de 4,5%, no fim de 2016, mas em “horizonte relevante”. Segundo analistas, isso significa, na prática, adiar esse objetivo para 2017. A decisão era esperada pelo mercado financeiro, já que subir ainda mais os juros poderia levar o país a uma recessão mais forte e agravar o quadro fiscal. E economistas já esperam que a inflação termine este ano perto de 10%.

“O Comitê entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficientemente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante da política monetária. O Copom ressalta que a política monetária se manterá vigilante para a consecução desse objetivo”, diz o BC, no comunicado.
 
Esse horizonte relevante é um período de dois anos. É esse o horizonte médio da política monetária. Às vezes pode ser um pouquinho a mais ou a menos, mas o que importa é que o Banco Central quis dizer que teremos inflação na meta no segundo semestre de 2017— explicou o ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas, que avalia a decisão de mudar o discurso como acertada e necessária.

O economista-chefe do Modal, Alexandre de Azara, avaliava que o BC só admitiria que a inflação convergiria para a meta em 2017 em dezembro: — Considerando que um “horizonte relevante” normalmente é um prazo de 18 meses, a expectativa do BC é que a inflação retorne ao centro da meta apenas entre março e junho de 2017.

Em comunicado aos clientes, o Banco Fator destaca que a volta da expressão “vigilante” para o comunicado, que estava presente na ata da última reunião, mantém espaço para alta da Selic, ainda que esse não seja o caminho mais provável.

A principal barreira para elevar os juros e conter a inflação é a crise econômica. A expectativa dos analistas é que a economia encolha 3% neste ano e que a recessão continue em 2016 com indústria em grave crise e consumo em forte retração.

Também pesam a incerteza política, a perda do grau de investimento e, principalmente, a falta de uma definição sobre o que acontecerá com as contas públicas. Alguns analistas consideram que a economia já vive uma situação de dominância fiscal, que ocorre quando o Banco Central fica sem condições de executar a política monetária, pois qualquer elevação de juros teria impacto muito negativo no déficit e na dívida pública, contribuindo para piorar as expectativas.

Tudo isso afeta o dólar: quanto mais ele sobe, mais combustível a inflação recebe.

A deterioração do quadro político e a barbeiragem de mandar um orçamento deficitário para o Congresso influenciaram o câmbio. Isso já tem efeito na inflação, como na alta do preço do pãozinho, por exemplo — analisou o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, que ressalta que ninguém esperava um desempenho tão ruim das contas públicas: — A herança da dupla Mantega-Augustin é mais desastrosa de que se poderia imaginar.

Submerso em incertezas econômicas, o Banco Central resolveu manter-se parado à espera de uma solução. A avaliação do governo é que, por mais que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) esteja em 9,49% nos últimos 12 meses, o pior já passou. Daqui pra frente, o índice oficial deve ficar mais comportado. Além disso, juros mais altos não afetariam o principal problema deste ano: o aumento de tarifas públicas. A energia deve ter alta de cerca de 50%. Essa demanda não é contida com juros mais altos.

Para fazer com que a inflação chegasse à meta de 4,5% no fim do ano que vem, o BC teria de dar um choque de juros e fazer com que a taxa básica (Selic) fosse a 18%, na visão de Maílson. Ele mesmo alerta que isso seria um erro. E que o ideal seria admitir que a promessa é utópica.— Nenhum Banco Central daria um choque de juros para fazer convergir a inflação a ferro e fogo num curto tempo num cenário como esse.

É consenso entre os analistas e dentro do próprio governo que todo o andamento da economia e a recuperação dependem de uma definição do quadro fiscal. Ou seja, é preciso colocar as contas públicas em ordem. Para isso, é preciso aguardar que as medidas fiscais — como a recriação da CPMF — sejam aprovado pelo Congresso Nacional.

O Banco Central tem de aguardar as negociações do Congresso sobre o cenário fiscal. O que ele poderia fazer? Introduzir uma retração maior na economia não seria uma política adequada — avalia Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional e economista-chefe do Banco Safra. — O que a gente precisa hoje na economia não é mais de juros. É de política fiscal.

Para Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, o BC está “de mãos amarradas”. — Não adianta elevar ou baixar os juros, enquanto não tiver um horizonte na política fiscal. Atualmente, o BC está de mãos amarradas, por isso a decisão de manter a Selic no atual patamar num horizonte mais prolongado.

Com o resultado da reunião, Tatiana Pinheiro, economista do Santander, avalia que o mercado deve rever a aposta num aumento da taxa no início do próximo ano, como indicava até agora o comportamento dos juros futuros. Para Tatiana, a Selic deve permanecer no patamar atual até o fim do ano e recuar a 11,5% até dezembro de 2016: — O Copom decidiu manter a Selic em 14,25%, o que deve se estender por um período prolongado, contando com o enfraquecimento da atividade econômica para mitigar as pressões inflacionárias. O BC também conta com o efeito defasado das últimas elevações dos juros.

O Brasil continua sendo o país com a maior taxa de juro real entre 40 nações, segundo levantamento do economista Jason Vieira, da Infinity Asset Management em parceria com o site Money You. Descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses, o juro real no Brasil é de 7,43%, seguido de Rússia (2,87%) e China, com taxa de 2,55%.— Somente um corte de cinco pontos percentuais retira o país da atual posição — disse Vieira.

O economista explica que o Brasil aparece com taxa muito mais elevada do que os países que ocupam as primeiras colocações no ranking porque houve um movimento recente de queda de juros em boa parte dessas nações. De acordo com o levantamento do economista, 30% dos países incluídos no ranking promoveram cortes nos juros recentemente e nenhum elevou a taxa.

 



Veículo: Jornal O Globo

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