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08/01/2013 09:33 - Alto custo da energia leva indústria a sugerir racionamento branco

Com nível de reservatórios baixo e preços altos, indústria já pensa em racionar consumo

 
Apesar de a presidente Dilma Rousseff ter afirmado, no último dia 27, que era “ridículo dizer” que o país corria o risco de racionamento de energia, os níveis cada vez mais baixos dos reservatórios das usinas hidrelétricas levaram as indústrias a já falar em reduzir o consumo, adotando um “racionamento branco”. A Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), que reúne as principais indústrias intensivas em energia, afirmou em nota que as empresas que compram energia no mercado livre poderiam reduzir o seu consumo neste momento.

A Abrace considerou preocupante o fato de que, com a redução do nível dos reservatórios, os preços da energia no mercado livre dispararam nos últimos dias. Segundo dados da Câmara de Compensação de Energia Elétrica (CCEE), o preço do megawatt/hora (MWh) atingiu o maior patamar dos últimos cinco anos: R$ 554,82. Esse preço representa um aumento de 4.194% em relação aos R$ 12,92 registrados em janeiro do ano passado. O temor de um possível racionamento fez com que os papéis das empresas do setor elétrico caíssem quase 5% ontem na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

Raimundo de Paula Batista, diretor da Enecel Energia — comercializadora de energia no mercado livre — disse que o governo deveria propor às indústrias eletrointensivas uma redução no consumo de energia por um período curto, de dois a três meses:

— É um racionamento branco, uma redução programada no consumo. Não afetaria o crescimento da economia no ano, mas permitiria de imediato uma redução da ordem de 3 mil MW de energia no consumo. O risco não é a curto prazo, mas sim o abastecimento em 2014, ano da Copa do Mundo.

A Abrade afirmou, em nota, que, diante dos elevados preços da energia no mercado livre, “empresas que estão comprando no mercado à vista podem avaliar a possibilidade de reduzir sua demanda neste momento”. A entidade afirmou ainda que, em função do funcionamento a plena carga das térmicas, o Encargo de Serviços do Sistema (ESS), cobrado nas tarifas, só em dezembro deverá atingir o recorde histórico de R$ 929,2 milhões, fechando 2012 total de R$ 2,7 bilhões.

Apesar de o chamado período de chuvas ter começado em novembro, até o momento o volume de água tem sido muito baixo. Ontem, o nível dos reservatórios das regiões Sudeste e Centro-Oeste estava em 28,5%, um pouco abaixo dos 28,8% do último dia 4 e bem próximo ao nível de segurança da área, que é de 28%. Já no Nordeste o nível está em 30,9%, contra 31,8% anteriormente. Ou seja, abaixo do patamar de segurança de 34%.

Comitê do setor elétrico se reúne na quarta-feira

O meteorologista Alexandre Nascimento, do Climatempo, destacou, por sua vez, que tudo indica que as chuvas previstas até abril, quando termina o período úmido, não serão suficientes para elevar significativamente o nível dos reservatórios. Segundo ele, seria preciso chover entre mil e 1.200 milímetros nos próximos meses para aumentar o volume de água nos reservatórios. Mas o volume esperado de chuva é de 350 milímetros.

— A expectativa é de chuvas irregulares e de baixo volume de água para os próximos meses, insuficientes para elevar o nível dos reservatórios — afirmou Nascimento.

Está marcada para amanhã uma reunião do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) para avaliar a situação dos reservatórios das usinas hidrelétricas e do abastecimento de energia no país. Segundo o Ministério de Minas e Energia, a presidente Dilma não participará. A presidente deve receber um relatório e, se for preciso, convocará uma reunião do Conselho de Política Energética.

O governo assegura que o fornecimento está garantido. Mas, para especialistas, começam a surgir alguns problemas de logística.

O professor da Universidade Federal de Itajubá Afonso Henriques Moreira, ex-secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia, disse que já relatos de falta de caminhões-tanques para fornecer gás para abastecer algumas térmicas.

— Pode não ter apagão de energia. Mas o custo está inadministrável, a situação está extremamente incômoda. Não sei se temos logística — afirmou Afonso Henriques.

O professor Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da UFRJ, disse que acendeu a luz amarela no governo e que a reunião é mais preventiva. A seu ver, o governo precisa ouvir o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), responsável pelo acompanhamento do setor. Para ele, até abril o governo não tem condições de decidir se vai ou não decretar racionamento.

— A chuva é uma probabilidade. e pode chover ou não. E a probabilidade histórica é de que chova no período úmido — disse o professor.

Ele admitiu que a situação é crítica e que a quantidade de chuvas está bem abaixo da média. E disse que o nível dos reservatórios está abaixo da curva de aversão a risco em todos os quatro subsistemas: Sul, Sudeste/Centro-Oeste, Nordeste e Norte. Por isso, explicou, não adianta ter linha de transmissão para levar energia de uma região a outra. Problema diferente do de 2001, quando houve o racionamento de energia e os reservatórios da Região Sul estavam cheios, mas não havia linhas de transmissão para enviar energia ao Sudeste. Mas, segundo o professor, ainda estamos no início do segundo mês do período chuvoso.

Já Afonso Henriques afirmou que a vazão dos rios deverá ficar abaixo da média em todas as bacias, sendo a situação pior nos rios Paraná e do São Francisco. Mas ele não acredita em racionamento:

— O último lugar que o governo vai cortar é na energia elétrica. Ele poderá, por exemplo, chamar os grandes consumidores e propor uma redução de 3% da carga e dar uma contrapartida, como uma linha de financiamento — disse.

Ele enfatizou que o correto seria que as usinas térmicas funcionassem durante todo o ano, para garantir um nível mais alto dos reservatórios das hidrelétricas:

— O modelo de operação do sistema está errado, estamos dizendo isto há muito tempo.

O governo vem lançando mão de todas as fontes de energia alternativas para compensar a falta de chuvas. As 204 hidrelétricas do país respondem por 65,98% da energia total produzida.

A segunda alternativa é utilizar as 1.606 termelétricas em operação, que representam 27,08%. Mas a questão é se elas serão suficientes para atender a todo o consumo do país.

Para a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), aumentou o risco de racionamento de gás.

— Não diria que estamos na eminência de ter apagão. O risco é maior de racionamento de gás, porque pode ser que governo precise pedir às industrias que abram mão de gás para ceder para as térmicas. Já tivemos episódios no passado, como em 2008 — disse Cristiano Prado, gerente de infraestrutura da Firjan.


Veículo: O Globo - RJ

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