Economia
01/08/2012 12:55 - Investidor externo aposta forte na indústria
O câmbio, que barateou a compra de ativos no Brasil, e o mercado consumidor ainda robusto atraíram o interesse dos empresários estrangeiros por aquisições no Brasil, principalmente no setor industrial. Apesar da queda na produção e do baixo otimismo doméstico, o ingresso de investimentos estrangeiros diretos para aquisições de participação no capital de empresas do setor industrial somou US$ 12,9 bilhões no primeiro semestre deste ano, um aumento de 33% em relação aos primeiros seis meses de 2011, segundo informações divulgadas pelo Banco Central.
Os dados mostram que esses investimentos foram para diferentes setores, mas estão concentrados em segmentos bastante relacionados com a demanda doméstica. Depois da metalurgia, os ramos alimentício e farmacêutico foram os que mais receberam aportes no período, indicando que o acirrado debate sobre o esgotamento da capacidade de consumo dos brasileiros ainda não é uma preocupação central para as multinacionais.
Especialistas avaliam que, apesar do momento ruim enfrentado pela indústria, que deve ter desempenho negativo no ano, para empresas estrangeiras que precisam lidar com perspectivas de recuperação muito moderada do consumo no longo prazo, uma escolha natural é procurar aumentar a exposição ao mercado interno brasileiro, ainda um ativo importante. No Brasil, o curto prazo é de baixo crescimento, mas essa não é a estimativa para o futuro.
"O mercado interno é cada vez mais o chamariz", afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização (Sobeet), Luís Afonso Lima. Para ele, as matrizes da multinacionais europeias e americanas, regiões que mais investem no país, enxergam o mercado doméstico do país como um ativo estratégico e buscam oportunidades nesses setores.
Ao adquirir a brasileira Yoki por R$ 1,75 bilhão em maio, a multinacional americana General Mills afirmou em nota que o Brasil tem um mercado consumidor atraente e é "uma das maiores economias e que crescem mais rápido ao redor do mundo". Com a expansão da classe média brasileira, disse ainda a empresa, "o consumo doméstico se tornou um importante motor de crescimento da economia".
Para André Biancareli, professor da Unicamp, o investidor estrangeiro está menos pessimista com o mercado doméstico nacional do que o empresário brasileiro e por isso investe em setores que podem se beneficiar desse quadro. "Montar um fábrica ou adquirir participações em empresas nacionais são decisões que dependem de um cenário de médio e longo prazo, e nesse caso a perspectiva é de crescimento ainda razoável da economia doméstica", avaliação baseada na expectativa de aumento da renda e manutenção do baixo nível de desemprego.
Fatores conjunturais também podem ter influenciado nesse resultado, na avaliação de Luís Lima, da Sobeet. Desde agosto, o BC brasileiro cortou a Selic em 4,5 pontos percentuais e mesmo que a autoridade monetária tenha que voltar a subir os juros no próximo ano, o fará de um patamar mais baixo. "A redução da taxa de juros influencia mais as perspectivas para o setor produtivo de bens de consumo do que de serviços, o que pode ser um fator adicional levado em conta", diz. A perda de valor do real neste ano também favorece aquisições ao torná-las mais baratas, explica o presidente da Sobeet.
Já os segmentos mais expostos à concorrência com os importados e aos crescentes custos de produção no país, como produtos químicos e derivados de petróleo, não atraem tanto o capital estrangeiro. No primeiro semestre de 2010, quando a indústria de transformação mostrava forte recuperação da produção após o tombo no ano anterior, 70% do investimento produtivo destinado à indústria foi para esses dois setores. No mesmo período deste ano, a fatia foi bem menor, de apenas 8%.
Biancareli ressalta ainda que não necessariamente o relevante fluxo de compras de participação no capital de indústrias brasileiras vai se traduzir em aumento da formação de capital físico. Os dados do BC não fazem distinção entre aportes para projetos em que haverá construção de fábricas, conhecidos como "greenfield", e processos de fusão e aquisição. Para ele, há motivações distintas na construção de uma instalação fabril no Brasil e aquisição do controle de empresas nacionais com o objetivo de ampliar a exposição ao crescimento do consumo.
Pesquisas indicam que as compras e vendas de empresas no primeiro semestre foram fortes e que o investidor estrangeiro teve papel relevante neste movimento. Entre janeiro e junho, a KPMG registrou número recorde de 433 operações de fusões e aquisições, alta de 14,2% em relação ao mesmo período de 2011. Desse total, mais da metade (225) foi de companhias internacionais comprando participação em empresas domésticas, situação que nunca havia sido vista até então. Nesse grupo de negócios, o crescimento foi de 47%. Para Luis Motta, sócio-líder da área de fusões e aquisições da KPMG, o país ainda é "rota natural" das multinacionais e o aumento do poder de compra da população é determinante nessa trajetória.
No levantamento feito pela consultoria, tecnologia da informação e serviços para empresas lideram com 82 operações no total. Motta lembra que as exigência de capital são diferentes para investimentos nesses setores e na indústria. Biancareli, da Unicamp, faz ressalva semelhante ao observar que no ano passado houve uma aquisição expressiva no setor de telecomunicações, o que inflou o aporte de capital estrangeiro para serviços. Em parte, diz, esse fato explica a desaceleração do investimento direto para compras nesse segmento, que recuaram 43,3% no primeiro semestre deste ano, na comparação com igual período de 2011.
Em junho, houve recuperação, influenciada em parte pelas novas leis do Cade, que apressaram algumas operações. Para Motta, da KPMG, o ritmo recorde de aquisições não deve ser mantido no segundo semestre. As matrizes com problemas de caixa e as perspectivas menos otimistas para a economia brasileira devem afetar esses números em alguma medida.
Veículo: Valor Econômico
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