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27/02/2012 07:57 - Inflação, mais do que o câmbio, desfavorece produtos 'made in Brazil'

Os produtos fabricados no Brasil estão menos atrativos que os importados em razão da valorização do real? Verdade. A valorização do real é o principal fator macroeconômico a explicar a perda da capacidade de competir da indústria nacional? Mentira.

A inflação brasileira, ainda elevada na comparação internacional, é a maior vilã nessa história. Leva 60% da responsabilidade, contra 40% da valorização cambial, no período entre 2003 e 2011.

Criemos um produto hipotético, um fogão produzido no Brasil, que em 2002 custava R$ 293. Competia cabeça a cabeça com um similar produzido nos EUA, vendido aqui pelo mesmo preço, então equivalente a US$ 100.

Como o mundo das hipóteses é vasto, imputemos uma segunda característica aos nossos fogões: seu preço veio sendo corrigido conforme a inflação média do país em que é produzido.

O fogão brasileiro chegou a 2011 custando R$ 550; o americano, US$ 122. Nenhuma valorização do real seria necessária para ferir de morte o competidor nacional. Se a taxa de troca do dólar tivesse se mantido a mesma de 2002, o fogão gringo custaria R$ 354. Quase R$ 200, ou 35%, menos que o brasileiro.

Mas, não bastasse a inflação, houve também pronunciada valorização da moeda nacional -43% de 2003 a 2011, se tomada a média anual da cotação. Seu efeito prático foi reforçar a vantagem que o competidor estrangeiro abriu por conta de a inflação brasileira (88%) ter sido quatro vezes a americana.

No exemplo ilustrativo dos fogões, o consumidor que optasse pelo produto "made in USA" pagaria R$ 204, agora considerada a cotação de 2011. Um abatimento de 62% em relação ao valor da mercadoria fabricada no Brasil.

Apesar de preponderante, o efeito da inflação na perda de competitividade nacional não costuma mobilizar as autoridades federais, tampouco o mundo empresarial. Já quando o dólar embica para baixo, alguma luz indicando "showtime" se acende no Ministério da Fazenda.

Se o Brasil tivesse cumprido a meta de inflação de 2003 até 2011, teria reduzido a menos da metade o impacto desfavorável da alta de preços para as mercadorias daqui.

O mercado global do dólar é descomunal em relação ao do real e determinante para a cotação entre as duas moedas. O "arsenal" de medidas cambiais que o governo brasileiro diz ter à mão pode apenas jogar alguma areia nas engrenagens desse movimento tectônico.

Já sobre a inflação, a arrecadação e o gasto público, a política macroeconômica federal tem muito mais influência. Desses fatores dependerá, cada vez mais, a capacidade de competir da indústria nacional.


Veículo: Folha de S.Paulo

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