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09/01/2012 13:33 - Holland prevê pressão menor sobre preços

A inflação de 2011 foi um ponto fora da curva, e a forte pressão sobre os preços não se repetirá em 2012 e nos demais anos do governo Dilma Rousseff, disse Márcio Holland, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, em entrevista ao Valor. Este ano, o desempenho do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passará a se basear sobre a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) atualizada, o que deve reduzir a taxa de inflação em até 0,4 ponto percentual.

Além disso, choques internacionais, como o de commodities, não devem se repetir na mesma intensidade, bem como problemas internos, como as elevações de preços do etanol e do setor de carnes, decorrentes de reestruturações das companhias dos dois segmentos, tendem a arrefecer já em 2012.

"Superamos um ano extremamente desafiador para a economia brasileira", afirma Holland, em referência à "complexa combinação" de 2011, quando o choque internacional de preços das commodities, iniciado no fim de 2010, se somou à instabilidade política da principal economia mundial, os EUA, e às dúvidas quanto à sobrevivência da zona do euro.

"Ainda assim, conseguimos fechar o ano com inflação dentro do intervalo do regime de metas, e com a entrada de US$ 65,3 bilhões de fluxo cambial", diz Holland, que é pós-doutor em economia pela Universidade de Berkeley (EUA).

A economia brasileira suportou choques de preços em itens muito sensíveis ao consumidor brasileiro, como algodão e o etanol, que é misturado ao combustível dos veículos em circulação no país. Enquanto o preço algodão em caroço saltou 107% ao longo de 2011, o etanol ficou 15,7% mais caro.

A elevação do valor do algodão foi tão dramática que provocou forte aumento de 8,3% em vestuário, mesmo com o alto grau de penetração de importados chineses e paquistaneses. "Os preços de vestuário cresceram acima do IPCA, mesmo em ano de IPCA salgado, e isso ocorreu em um setor com os maiores índices de importação do Brasil", afirma o secretário.

No caso do etanol - e também nas carnes -, o Ministério da Fazenda entende que há um processo de reestruturação do setor, iniciada após a crise mundial de 2008, com fusões e aquisições entre as empresas. "A crise mundial pegou os dois setores altamente alavancados, preparando grandes investimentos", explica Holland. "No processo de renovação iniciado em 2009, muitos canaviais, no caso do etanol, não foram ampliados por novos investimentos, algo que começou a ocorrer apenas no ano passado. Isso será impulsionado agora, com novos estímulos [do governo, concedidos em 2011]."

Além disso, o secretário aponta choques associados à metodologia de cálculo ou nível de informação fornecida pelos agentes econômicos. Nesse caso estão as passagens aéreas, que registraram elevação de 52,9% no ano passado, e as tarifas bancárias. Enquanto as passagens aéreas subiram fortemente pela metodologia do IBGE, que calcula o IPCA, pelo modelo adotado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), as passagens ficaram 17% mais baratas.

Pelos cálculos da secretária de Política Econômica, os bilhetes aéreos representaram 0,2 ponto percentual do IPCA. Ou seja, a inflação oficial de 2011 seria de 6,3%, e não de 6,5%, caso as passagens ficassem estáveis ao longo do ano.

O salto do IPCA entre setembro de 2010 e abril de 2011, decorrente do surto de preços das commodities, não foi um fenômeno brasileiro. Holland trabalha com uma lista de 38 países, entre desenvolvidos e emergentes, em que todos, sem exceção, terminaram 2011 com taxa de inflação acima da meta perseguida.

Na Turquia, a meta era de 5,5%, mas a taxa ficou em 10,5%. No Reino Unido a inflação terminou em 4,8%, muito acima da meta de 2%. Mesmo caso do Canadá, cuja taxa de 2,9% é quase um ponto percentual acima do teto da meta, e dos EUA, onde a meta informal de inflação em torno de 2% ao ano foi descumprida - a inflação ao consumidor terminou o ano em 3,4%.

"Trata-se de um fenômeno mundial, todos passaram por essa transição em 2011, e agora os preços vão começar a se acomodar", afirma Holland, para quem foi fundamental para o desempenho do IPCA não furar o teto da meta o fato de a economia brasileira ficar "relativamente insular" aos problemas mundiais. Nem a apreciação do real em relação ao dólar nos primeiros oito meses do ano passado foi capaz de neutralizar a forte elevação de preços das commodities. "A apreciação não foi proporcional a essa transmissão de preços", diz.

Na avaliação do secretário, uma parte muito razoável da aceleração do IPCA entre 2010, quando a taxa fora de 5,9%, e 2011, decorreu do modelo de crescimento econômico brasileiro. A opção pelo crescimento impulsionado pela demanda agregada (investimento e consumo doméstico) produziu drástica queda nos índices de pobreza, em decorrência dos incrementos salariais e da expansão do mercado de trabalho.

O rendimento médio real obtido pelo trabalhador brasileiro aumentou 5,2% no ano passado, depois de subir 7,5% no ano anterior. De 2003, início do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, até agora, o salário mínimo saltou 66% em termos reais (já incorporando o mínimo deste ano, de R$ 622).

Apoiando-se em dados da Fundação Getulio Vargas (FGV), Holland aponta que a taxa de pobreza, isto é, o número de brasileiros pobres como proporção do total da população, caiu dos 35% a 30% do governo Fernando Collor (1990-92) para 28%, em 2003, e agora ronda os 12%.

"Isso tem um custo, uma vez que cada vez mais pessoas são incorporadas ao mercado, pressionando os preços de serviços, que não sofrem competição com importados", diz Holland, para quem esse é um custo que o Brasil tem, em troca da resolução de grave problema social. "Um dia teríamos que pagar esse custo, e a inflação ficar 0,5 ponto percentual maior por causa disso, convenhamos, vale a pena."

Essa mudança na forma como a sociedade estrutura seus hábitos de consumo será incorporada, a partir deste mês, nos cálculos do IPCA, que passam a usar dados da mais recente Pesquisa de Orçamento das Famílias (POF), do IBGE, realizada entre 2008 e 2009. A inflação oficial de 2011 foi a última a ser estimada com base na POF de 2002 e 2003.

"Tudo aquilo que não consumíamos nos anos 1990 passamos a consumir agora, e a oferta, em serviços, não acompanhou o ritmo. Estamos vivendo a primeira etapa desse ciclo de transição do consumo, que passa por uma sociedade mais sofisticada", diz Holland.


Veículo: Valor Econômico

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