Economia
02/01/2012 10:37 - Setor de serviços atrai investimento externo e doméstico
Livre da concorrência dos importados e impulsionado pelo fortalecimento do consumo doméstico, o setor de serviços deslancha no Brasil e já concentra uma parte expressiva dos investimentos que estão sendo feitos na economia, seja com recursos estrangeiros, seja de projetos apoiados por financiamento local.
Os estrangeiros, que concentravam seus investimentos na indústria, mudaram de foco. Dados do Banco Central mostram que dos US$ 62,3 bilhões que chegaram ao país entre janeiro e novembro de 2011 para projetos no setor produtivo, 47% foram aplicados em serviços (incluindo comércio e infraestrutura), enquanto a indústria recebeu 37%. No mesmo período de 2010, a indústria recebeu 40,5% dos investimentos estrangeiros diretos, ao passo que a fatia de serviços ficou com 28%.
O interesse pelo setor não ficou restrito aos investidores internacionais. Dos R$ 91,6 bilhões emprestados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nos nove primeiros meses de 2011, 52,7% foram destinados a empresas de serviços, fatia consideravelmente maior que a de 37,7% verificada no mesmo intervalo de 2010.
Tomando por base as consultas realizadas à instituição de fomento no período, esse movimento deve persistir nos próximos meses. De janeiro a setembro de 2011, 49,4% dos valores envolvidos referiam-se a projetos de serviços, ficando apenas 35,6% com a indústria. A participação de serviços nas consultas é crescente, ultrapassando o percentual de 47,5% visto no mesmo período do ano anterior.
Toda essa vitalidade do setor é sustentada, em parte, pelas pequenas e médias empresas, que vêm ganhando espaço nos financiamentos do BNDES. Sua participação no total de desembolsos da instituição cresceu de 26,2% entre janeiro e setembro de 2010 para 39,5% no mesmo período de 2011, com a liberação de R$ 36,2 bilhões em créditos - 8% mais que no ano passado. Embora as empresas de pequeno e médio porte não respondam pela maior parte dos valores emprestados, elas são maioria absoluta quando se trata de número de transações. Das 629 mil operações realizadas pelo BNDES nos nove primeiros meses desse ano, 94% envolveram pequenas e médias empresas.
"Como essas empresas são menores, o valor médio por operação também é menor. O crescimento do número de operações mostra que está havendo uma pulverização dos investimentos, impulsionada, sobretudo, pelo Cartão BNDES", diz Ana Cristina Rodrigues, chefe do Departamento de Bens de Consumo, Comércio e Serviços dos BNDES, referindo-se ao cartão de crédito pré-aprovado da instituição. De janeiro a setembro de 2011, o uso do cartão por empresas de serviços cresceu 75%, com a liberação de R$ 1,25 bilhão em financiamentos.
O aumento da renda da população e a expectativa gerada pela Copa do Mundo de 2014 e pela Olimpíada de 2016, na avaliação de Ana Cristina, estão estimulando os investimentos no setor de serviços, que, em sua opinião, ainda conta com um grande potencial de expansão no Brasil. "A maior oportunidade para diversificação do consumo está nos serviços", acrescenta Pedro Gonçalves, consultor do Sebrae, comentando que o aumento da renda permite aos brasileiros usufruir de serviços aos quais antes não tinham acesso, como cursos livres ou universitários, atendimentos de saúde e eventos de lazer.
As projeções da Confederação Nacional de Serviços (CNS) apontam para expansão entre 5,5% e 6,5% no consumo das famílias em 2012, permitindo crescimento de 5% no setor de serviços privados não financeiros ao longo do ano.
A expectativa é de que o Brasil siga o exemplo das economias desenvolvidas e eleve a participação dos serviços (incluindo comércio) no Produto Interno Bruto (PIB) de 60% para patamares acima de 70%. "Todos os países desenvolvidos passaram por esse processo. No Japão, por exemplo, isso ocorreu nas décadas de 1950 e 1960", observa José Luiz Rossi Júnior, professor do Insper responsável pela apuração do Índice de Confiança de Pequenos e Médios Negócios (IC-PMN), elaborado em parceria com o Santander. O indicador mostra que desde a recuperação da economia brasileira após o estouro da crise financeira em 2008, os empresários do setor mantêm o otimismo acima dos 73 pontos, numa escala que varia de zero a 100. A confiança do setor de serviços também se destaca nas apurações da FGV, ao manter-se acima da verificada entre industriais e consumidores.
"O mercado brasileiro é bastante carente de serviços de qualidade", afirma César Fischer, superintendente de Pequenas e Médias Empresas do Santander, lembrando que o fato de ser possível desenvolver negócios no setor dispondo de baixos investimentos ajuda a impulsionar a abertura de empresas. Os dados mais recentes do setor mostram que em 2009 existiam no país 918.200 empresas de serviços, sendo 31,4% voltadas às famílias, 30,5% a empresas, 7,7% de informação, 15% de transportes e 15,4% de outras atividades.
Muitas vezes, lembra o presidente da Agência de Fomento Paulista, Milton Luiz de Melo Santos, as empresas abrem as portas contando apenas com investimentos próprios, sobretudo quando se trata de serviços às famílias. "O setor de serviços é composto basicamente por pessoas. A maior parte do gasto se deve a contratação e treinamento. Por isso, o crédito para essas empresas, normalmente, é apenas para capital de giro." Entre as empresas de serviços destinados às famílias, 74,5% operam com no máximo 49 funcionários.
O principal estímulo ao setor de serviços, porém, vem do ganho de rendimento da população brasileira, que de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi de 4% nos 12 meses encerrados em setembro de 2011, já descontada a inflação. No período, o consumo das famílias cresceu 5,7%.
"Quanto mais renda as pessoas têm, mais elas gastam com serviços. Como ainda temos um mercado de trabalho apertado, com desemprego relativamente baixo e salários sendo reajustados acima da inflação, a expectativa é de que os serviços continuem sendo fortemente demandados", comenta Silvio Sales, consultor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Sales, entretanto, acrescenta que há um jogo de forças entre os estímulos à expansão do setor de serviços e a piora do quadro internacional. "A crise mexe com as expectativas tanto de empresários quanto de consumidores. Se houver uma deterioração muito acentuada do cenário externo, os investimentos poderão ser impactados e, consequentemente, o mercado de trabalho sofrerá. O que vai determinar a expansão do setor de serviços é a manutenção do poder de compra da população", afirma.
Em 2012, o salário mínimo será reajustado em cerca de 14%, influenciando não só a remuneração dos trabalhadores que recebem o piso, mas também daqueles que se encontram em uma faixa ligeiramente acima, segundo avaliação do presidente da CNS, Luigi Nese. "Nas convenções coletivas, provavelmente será possível ver esse movimento. Grande parte dos recursos extras deverá ser gasta com serviços", diz.
Além disso, César Fischer, do Santander, acrescenta que apenas a predisposição do governo em incentivar a economia já é suficiente para manter o otimismo de empresários e consumidores em patamar elevado, contribuindo para a realização de negócios. Nesse cenário, Pedro Gonçalves, do Sebrae, considera o papel da Copa e da Olimpíada coadjuvante. "É certo que estabelecimentos como lanchonetes e estacionamentos surgirão nos arredores dos estádios, mas essas oportunidades serão apenas adicionais."
Alimentando o conjunto das variáveis que devem interferir no desenvolvimento do setor de serviços no Brasil está a ampliação em 50% das faixas de enquadramento do Simples Nacional, aprovada em novembro. O teto de faturamento passou de R$ 240 mil a R$ 360 mil para microempresa e de R$ 2,4 milhões para R$ 3,6 milhões no caso de pequenas empresas. "Muitas vezes, as empresas evitavam crescer para não sair do Simples. Agora há uma folga maior, o que deve contribuir positivamente para o crescimento do setor", pontua Thiago de Carvalho, gerente de Planejamento para Pequenas e Médias Empresas do Santander. Pelos cálculos da CNS, cerca de 85% das empresas de serviços no Brasil faturam até R$ 3,6 milhões ao ano.
Veículo: Valor Econômico
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