Economia
05/04/2011 09:31 - Alta da nota do Brasil pressiona câmbio
Agência Fitch eleva classificação da dívida brasileira e aumenta possibilidade de entrada de dólares; especialistas esperam mais medidas do governo
A agência de classificação de risco de crédito Fitch, uma das mais respeitadas do mercado global, melhorou ontem a nota do Brasil - de BBB- para BBB. Na prática, significa que, segundo os analistas da empresa, o País ficou ainda mais seguro para receber investimentos. Com isso, a expectativa é de que mais dólares venham para cá, o que tende a valorizar o real, movimento que preocupa o governo.
"Mas é melhor ter esse problema do que como era no passado, quando faltavam dólares", ponderou o ministro da Fazenda, Guido Mantega. A moeda americana encerrou a segunda-feira cotada a R$ 1,609, queda de 0,19%. É o valor mais baixo desde 8 de agosto de 2008.
"Não houve nada de anormal hoje (ontem), mas, nos próximos dias, é provável que o Brasil atraia ainda mais recursos do exterior por causa da mudança da nota pela Fitch", observou um operador de câmbio que pediu para não ser identificado.
Outros especialistas esperam para os próximos dias mais medidas do governo para tentar segurar a alta da moeda brasileira. O Ministério da Fazenda teme que o real valorizado prejudique a indústria, na medida em que estimula as importações.
A Fitch é a primeira entre as três principais agências de classificação de crédito a elevar o chamado rating do Brasil depois que o País entrou no grupo conhecido como grau de investimento.
Duramente criticadas por seu papel durante a crise global dos últimos anos, essas agências trabalham com escalas de classificação. A partir de um determinado ponto, as empresas e os países avaliados são considerados quase livres de risco de calote.
No primeiro semestre de 2008, a Fitch e a Standard & Poor"s colocaram o Brasil nesse grupo. De lá para cá, o País ainda não havia sido promovido de novo.
"Fomos encorajados (a promover o Brasil) pelo fato de que o governo de (Dilma) Rousseff tem dado sinais de contenção fiscal", afirmou à Agência Estado a diretora sênior de ratings soberanos para América Latina da Fitch, Shelly Shetty.
Outras agências, como a Standard & Poor"s, esperam mais notícias positivas na área fiscal para elevar de novo o Brasil. "Desde a promoção anterior, o Brasil evoluiu em algumas áreas, retrocedeu em outras. Na fiscal, não avançou a ponto de ter a nota melhorada novamente", disse o analista da S&P responsável pelo País, Sebástian Briozzo.
Por meio da assessoria de imprensa, a Moody"s, a outra grande do setor, informou que vai rever o rating do Brasil no segundo trimestre. Como a perspectiva para a nota do País é positiva, a revisão deve ser para melhor.
Com a mudança de ontem, o Brasil se iguala, na escala da Fitch, a nações como Rússia e Lituânia. E fica à frente de Índia, Peru e Grécia, entre outras. Em compensação, continua atrás de Irlanda e Espanha, dois dos países europeus que estão no centro de uma crise de confiança.
Mantega confirma medidas para o câmbio
Ministro comemora elevação da nota pela Fitch, mas diz que País vai atrair mais dólares e que o governo ''seguirá tomando medidas''
Apesar de mostrar contentamento com o aumento da nota do Brasil pela agência de classificação de risco Fitch, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que essa situação deve estimular ainda mais a entrada de dólares, o que no momento é um problema.
Mantega admitiu que o governo continuará tomando medidas para conter o excesso de entrada de dólares, que tem levado à valorização do real e minado a competitividade do setor exportador nacional, além de tornar mais dura a concorrência interna com importados.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, disse ontem por meio de nota à imprensa que a decisão da Fitch de elevar a nota do Brasil foi "um reconhecimento da consistência da política econômica ao longo dos anos e da melhora dos seus fundamentos alcançada por meio das políticas de meta de inflação, câmbio flutuante, acúmulo de reservas internacionais, responsabilidade fiscal e solidez do sistema financeiro".
De acordo com Tombini, a boa notícia, contudo, não reduz a "determinação do BC em continuar trabalhando para que os avanços obtidos até agora continuem a ocorrer em um ambiente econômico de estabilidade monetária e solidez financeira".
Medidas. A declaração de Mantega confirma as informações que circularam nos bastidores no fim da semana passada, de que novas iniciativas para conter a alta do real estão sendo preparadas. No fim de março, o governo elevou para 6% o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos empréstimos de até um ano tomados no exterior por empresas e bancos. A medida, no entanto, não conseguiu frear o fortalecimento do real, que se acelerou na quinta-feira e sexta-feira e levou o dólar a R$ 1,61.
O problema é que à medida que ações são anunciadas pelo governo, o repertório de política econômica diminui e mesmo assim o dólar continua caindo em relação ao real, reforçando a preocupação do governo.
Para enfrentar o problema, o governo pode promover uma nova rodada de aumento de IOF, seja para aplicações no mercado financeiro, seja para empréstimos tomados no exterior. Além de mexer na alíquota do imposto, o governo poderia estender a tributação maior para empréstimos com prazos superiores a um ano. O governo pode ainda acionar o Fundo Soberano do Brasil (FSB) para comprar dólares.
"Câmbio simultâneo". Ontem, no fim do dia, o Conselho Monetário Nacional (CMN) anunciou uma medida para evitar dribles na taxação de 6% dos empréstimos externos de até um ano.
A iniciativa exige que se faça um "câmbio simultâneo" de entrada e saída de recursos em operações de renovação ou renegociação dos termos de empréstimos externos e também quando alguém assume dívida externa de outro. Assim, em operações de até um ano, os 6% de IOF também serão cobrados nas renovações, repactuações ou assunções de dívida externa.
Repercussão
ALEXANDRE TOMBINI
PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL
"O BC continua trabalhando para que os avanços continuem em ambiente de estabilidade monetária e solidez financeira"
Exceção
"Ainda que tenhamos críticas ao País do ponto de vista macroeconômico, o Brasil está melhor do que países da Europa e os EUA", diz o economista da PUC-SP Antonio Corrêa de Lacerda.
Veículo: O Estado de S. Paulo
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