Economia
09/06/2010 11:10 - Demanda puxa PIB e exige alta forte na importação
País cresce 2,7% na comparação com o fim de 2009
O resultado do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre de 2010 confirmou o forte ritmo de crescimento da economia brasileira. Na série com ajuste sazonal, o PIB cresceu 2,7% sobre o trimestre anterior, o equivalente a 11,2% em termos anualizados. Na comparação com o primeiro trimestre de 2009, a alta foi de 9%, a maior da série histórica iniciada em 1995. Se fosse apenas pela demanda interna, o resultado teria sido ainda maior e chegaria a 11,8%. Isso não ocorreu porque uma parcela do consumo e do investimento foi atendida por importações, o que fez o setor externo "tirar" 2,8 pontos percentuais do PIB brasileiro.
As compras externas de bens e serviços subiram 39,5% sobre janeiro a março de 2009, percentual muito superior aos 14,5% das exportações. Essa explosão de importações foi a contrapartida da crescente demanda doméstica (consumo das famílias e do governo, investimento em máquinas e equipamentos e na construção e variação de estoques), diz o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero. Para comparar, em 2009 o setor externo colaborou positivamente com 0,1 ponto para o PIB, que caiu 0,2%.
Para Bernardo Wjuniski, economista da Tendências Consultoria, a distância entre o aumento da demanda interna e a expansão do PIB deve diminuir ao longo do ano, como efeito da maturação dos investimentos realizados desde o ano passado. O economista estima que o PIB passará por expansão de 6,6%, enquanto a absorção interna da economia no ano será de 7,4%.
Um ponto importante do resultado das contas nacionais foi o avanço acentuado da taxa do investimento como proporção do PIB, que atingiu 18% no primeiro trimestre, como nota o economista-chefe da Prosper Corretora, Eduardo Velho. É um número bastante superior aos 17,1% do PIB do trimestre anterior e dos 16,3% do mesmo trimestre de 2009. "O dado é bastante positivo, embora não tenha sido suficiente para interromper o crescimento da utilização da capacidade instalada da indústria", diz.
Velho aposta na continuidade da expansão firme da formação bruta de capital fixo (FBCF, medida do que se investe na construção civil em máquina equipamentos) nos próximos trimestres, porque a confiança dos empresários segue elevada, dada a expectativa favorável sobre a demanda futura. A LCA Consultores destaca o fato de o investimento ter voltado ao nível pré-crise. "No período janeiro-março, a FBCF ficou 0,4% acima da observada em julho-setembro de 2008."
Responsável por 60% do PIB, o consumo das famílias cresceu no primeiro trimestre 1,5% sobre o anterior, uma desaceleração em relação ao ritmo dos três trimestres anteriores. "Isso foi até certo ponto surpreendente, levando em conta o bom desempenho do crédito ao consumo e da massa salarial nos primeiros três meses do ano", diz o analista Antonio Madeira, da MCM Consultores. A forte base de comparação ajuda a explicar esse movimento, pois o consumo avança desde o segundo trimestre de 2009 a um ritmo forte.
Para Aurélio Bicalho, economista do Itaú Unibanco, o consumo das famílias deve continuar a perder força, enquanto os investimentos permanecem em níveis elevados. "São fatores transitórios que influenciaram o PIB forte no primeiro trimestre e, agora que eles saíram, vão provocar uma desaceleração considerável na leitura do segundo trimestre, que já está em curso, como os dados de produção industrial e comércio varejista mostram."
Diante da forte expansão dos investimentos - 26% maiores no primeiro trimestre de 2010 sobre igual período do ano passado - o economista-chefe do Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, avalia que um novo ciclo de crescimento foi inaugurado na economia brasileira. "Tivemos o crescimento puxado pelo consumo, como no Plano Cruzado, nos anos 80, e o crescimento sustentado pelas exportações, como ocorreu nos primeiros anos do governo Lula", diz ele, para quem o crescimento agora é impulsionado pelos investimentos. "É um investimento que ocorre em todos os setores, demandando máquinas e equipamentos e também mão de obra."
Nos primeiros três meses do ano, a atividade registrou também grande recomposição de estoques. Pelas contas da LCA, a variação de estoques respondeu por 1,7 ponto percentual da alta de 2,7% registrada pelo PIB no primeiro trimestre. Para Madeira, essa formação de estoques, que ajudou o crescimento no primeiro trimestre, pode levar a uma moderação da atividade industrial nos trimestres seguintes.
Governo espera desaceleração no 2º tri, mas vai elevar projeção para o ano
Ainda que a economia não cresça nada do segundo ao quarto trimestre, já está garantido uma alta de 6% no Produto Interno Bruto (PIB) este ano. Se a taxa de crescimento cair dos 2,7% registrados até março para uma média de 1% nos três trimestres restantes, o crescimento chegará a 7,6%.
É com base nessa realidade que o Ministério da Fazenda fará uma nova projeção para o PIB deste ano, informou o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa, ontem. "Com certeza será acima de 6,5%", disse. O Banco Central, que até agora trabalhava com um crescimento de 5,8% para o exercício, também vai reavaliar suas estimativas, no relatório de inflação de junho, para algo em torno 6,5% a 7%. A última vez que o PIB cresceu na casa dos 7% foi em 1986 (7,49%)
A força da demanda doméstica traduziu-se no aumento das importações - de 13,1% se comparado com o trimestre imediatamente anterior - sinal de que a demanda cresce acima da oferta. As exportações aumentaram apenas 1,7%. Dos 9% de crescimento, a demanda interna foi responsável por 11,9% e a externa, por menos 2,9%.
Os técnicos do governo chamaram a atenção para dois indicadores que reforçam uma melhor qualidade do crescimento brasileiro: investimentos e poupança interna. A taxa de investimento, que vai ampliar a oferta de bens e serviços, teve aumento de 18% sobre 2009, 1,7 ponto percentual acima de igual período do ano anterior (16,3%). Desses, 1,5 ponto percentual decorreu do aumento da poupança interna.
Aposta-se, agora, na desaceleração a partir do segundo trimestre, fruto da retirada dos incentivos concedidos no auge da crise global e do aperto monetário. Soma-se a isso a própria base de comparação do PIB que já resultará em desaceleração, argumenta a Fazenda. No ano passado a economia teve desempenho negativo de 1,5% no primeiro trimestre (o dado anterior de menos 0,9% foi corrigido) e crescimentos de 1,5%, 2,2% % e 2,3% nos demais trimestres - segundo dados revisados ontem.
Amanhã o Copom deve sacramentar novo aumento de 0,75 pontos na taxa Selic, elevando-a para 10,25% ao ano, em mais uma rodada de aumento dos juros para moderar o crescimento da demanda e enquadrar a inflação.
O desenrolar da crise na Europa é outro elemento que deve contribuir para a desaceleração da economia. "A situação está piorando muito e é preocupante para o mundo inteiro", disse o secretário, que embarca amanhã para Bruxelas para um encontro com representantes da União Europeia.
Da Alemanha o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao comentar os dados do PIB, acrescentou: "Um outro fator que ajudará no desaquecimento é a crise europeia, que diminui a disponibilidade de crédito para a economia brasileira e dificulta a rolagem da dívida das empresas. Vai, também, dificultar os IPOs e diminuir a abertura de capital das empresas".
O ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, considerou os 9% exagerados e disse que o ideal é uma taxa entre 6% e 6,5%. Para ele, o ritmo do primeiro trimestre pode levar o país a esbarrar na capacidade de produção e a pressões de preço de matérias primas e bens intermediários, além de causar "problemas de logística". O ministro concorda com o aperto monetário e prevê novo aumento da taxa Selic hoje.
Para o presidente do BC, Henrique Meirelles, o crescimento "vigoroso" do primeiro trimestre "confirma que a economia se recuperou integralmente" e mostra o acerto da estratégia de combate à crise. Em rápido pronunciamento, ele destacou que o avanço mais pronunciado da indústria e do agronegócio contribui para "balancear" o crescimento. Ele apontou o "resultado particularmente importante" do investimento.
Veículo: Valor Econômico
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