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13/06/2024 12:14 - Correção do FGTS deve garantir reposição da inflação, decide Supremo

  Além de servir como poupança, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) tem uma dimensão social, o que justifica critérios de correção diferentes dos praticados pelo mercado financeiro.

  Esse entendimento é da maioria do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que decidiu manter a correção do FGTS a 3% ao ano, mais a Taxa Referencial (TR). A corte também estabeleceu que a correção deve garantir, no mínimo, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), índice oficial da inflação. A decisão valerá a partir da publicação da ata de julgamento.

  A proposta de que a correção garanta no mínimo o IPCA foi feita pela Advocacia-Geral da União no curso do julgamento, após negociação com centrais sindicais.

  Prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Flávio Dino. Ele foi acompanhado integralmente pelos ministros Cármen Lúcia e Luiz Fux, e parcialmente pelos ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.

  O relator da matéria, ministro Luís Roberto Barroso, propôs que a correção não poderia ser inferior à caderneta de poupança. Ele foi seguido pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin.

 

O caso

  Na ação, o partido Solidariedade questionou dispositivos que impõem a correção dos depósitos nas contas vinculadas do FGTS pela Taxa Referencial (TR).

  A legenda alegou que essa taxa está defasada se comparada ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E). Por isso, solicitou que o crédito dos trabalhadores fosse atualizado por “índice constitucionalmente idôneo”.

  O caso começou a ser analisado pelo Plenário em abril de 2023. Na ocasião, votaram o relator e o ministro André Mendonça. Na sequência, o ministro Nunes Marques pediu vista. O julgamento foi retomado em novembro, mas foi paralisado por um pedido de vista feito por Zanin.

 

Divergência vencedora

 

  No voto que prevaleceu no julgamento, Flávio Dino concordou com a proposta feita pela AGU, segundo a qual deve ser mantida a sistemática de remuneração das contas, com a TR mais 3%, incluída agora a distribuição de lucros — sendo garantida, em qualquer cenário, ao menos a inflação pelo IPCA.

  Com isso, disse Dino, o FGTS mantém as dimensões de ser uma poupança individual, ao mesmo tempo em que sua função social não é afetada. Os recursos do FGTS são usados para financiar políticas públicas governamentais, em especial as voltadas à construção de habitações para a população de baixa renda.

  Ao propor que a correção seguisse a poupança, Barroso disse que o FGTS é uma poupança compulsória que rende menos do que os demais tipos de aplicação. Dino, no entanto, sustentou que o fundo não pode ter como referência o mercado financeiro.

  “A referência não pode ser o mercado financeiro, porque isso teria um impacto no acesso à linha de crédito. Por que a remuneração é essa e não aquela? Para viabilizar o efeito social do FGTS”, disse Dino.

   "Há uma contribuição maior do empregador (em salários maiores) e esse dinheiro compõe o fundo público com uma função social que beneficia quem? Os mais pobres. No momento em que você financia habitação e saneamento, você está gerando emprego para os mais pobres. Por outro lado, quem são os destinatários das casas? Os mais pobres”, prosseguiu ele.

 

Improcedente

 

  Zanin foi quem abriu a divergência. Ele votou para rejeitar a ação com base em argumentos parecidos com os de Dino. Para Zanin, os recursos do FGTS sempre estiveram intrinsecamente ligados às políticas de construção de moradias, de modo que seria temerário alterar a correção, sob o risco de afetar políticas públicas.

  “Desse modo, tenho a compreensão de que as finalidades sociais do FGTS particularmente voltadas ao déficit habitacional também adquiriram dignidade constitucional quando a Constituição recepcionou e o constitucionalizou nos capítulos dos direitos sociais, ao lado, dentre outros, do direito à moradaria”, afirmou Zanin.

  O ministro também entendeu que não cabe ao Judiciário afastar critérios de correção monetária escolhidos pelo legislador com base em razões de ordem econômica e monetária.

  “Ao meu ver, ao ditar standards econômicos a serem alcançados em razão da desvalorização da moeda, o Judiciário adentra indevidamente não apenas em aspectos da política monetária, reservadas ao Executivo e ao Legislativo, como também acaba flertando perigosamente com uma gradual reindexação da economia.”

  Ao contrário de Dino, Zanin votou por recusar a proposta da AGU. Ele disse, no entanto, que caso ficasse vencido, adotaria a sugestão do órgão. Como foi formada maioria contra manter a TR, mas não houve mais de seis votos em nenhuma corrente específica, o colegiado considerou que o voto médio estava mais próximo do apresentado por Dino.

  Seguiram Zanin os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

 

Voto do relator

 

  Ao votar em abril, Barroso rejeitou os argumentos da União de que o rendimento do FGTS é baixo porque os recursos do fundo são utilizados para financiar políticas de habitação, saneamento básico e infraestrutura. Segundo ele, os valores que integram o fundo são patrimônio dos trabalhadores, e não patrimônio público.

  “Não é legítimo impor a um grupo social o ônus de financiar com seu dinheiro políticas públicas governamentais. Há uma inversão de valores, em que os mais pobres financiam os mais abastados em muitas situações. Ninguém é um meio para realizar fins alheios. Quando você apropria o dinheiro do trabalhador, sem remunerá-lo adequadamente, para atingir fins públicos, você simplesmente transformou o trabalhador em um meio.”

  Sobre o baixo rendimento do FGTS, apesar de se tratar de uma poupança compulsória, Barroso pediu “empatia” dos mais ricos.

  “Imagine a alta classe média brasileira, que investe em renda fixa, em fundos de ações, em fundos de multimercado e em câmbio, se de repente viesse uma regra que dissesse: ‘Todas as suas aplicações terão uma rentabilidade pré-determinada abaixo da poupança porque o país está precisando fazer investimentos sociais importantes’. O que aconteceria se hoje se editasse essa norma dizendo isso? O mundo ia cair”, afirmou Barroso.

  “Os trabalhadores têm parte do seu fundo de garantia, ou seja, da sua poupança compulsória em caso de desemprego, sacrificada para custear investimentos que interessam à sociedade por inteiro”, prosseguiu o magistrado.

ADI 5.090

Tiago Angelo – Correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

 

 

Fonte: Revista Consultor Jurídico – 12/06/2024

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