Carnes / Peixes
26/07/2010 09:44 - Carne "ilegal"? Não, obrigado.
Pesquisa do Idec mostra que após assinarem acordos com o Ministério Público Federal do Pará e o Greenpeace, os frigoríficos começam a mudar sua postura, mas o consumidor continua sem informações importantes na hora da compra.
O Pará não é o estado brasileiro que mais aparece nas manchetes dos jornais. E quando está nelas, quase sempre é por envolvimento em casos de trabalho escravo, desmatamento ou atividade pecuária em áreas florestais. Mas não desta vez. É de lá que vem uma boa notícia em relação à sustentabilidade da cadeia de carne bovina. A campanha Carne Legal, lançada pelo Ministério Público Federal do Pará (MPF-PA) no início de junho, pretende alertar o consumidor sobre a importância de saber a origem do gado e fazer com que os frigoríficos e supermercados mudem sua postura. O direito de o consumidor saber se a carne que compra está comprometida com crimes ambientais, fundiários e trabalhistas é garantido pela Constituição Federal e pelo Código de Defesa do Consumidor.
A campanha, que conta com o apoio do Idec e da ONG Repórter Brasil, dá continuidade a ações anteriores do MPF-PA, que há três anos identificou fazendas pecuaristas que comprovadamente desrespeitavam a legislação ambiental, além de uma que estava localizada em terra indígena. Com esse documento em mãos, o MPF-PA procurou, no fim de 2009, os maiores frigoríficos do país e sugeriu que eles assinassem um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), comprometendo-se a não comprar gado de tais fazendas.
Pode parecer pouco, mas é um grande passo. Em pesquisas anteriores do Idec, publicadas na REVISTA DO IDEC em junho de 2008 e fevereiro de 2009 (poucos meses antes do acordo entre frigoríficos e o MPF-PA), ficou claro que nenhum dos elos da cadeia estava preocupado com as condições da pecuária. De lá para cá algo mudou. "Essa passou a ser uma preocupação das empresas do setor frigorífico, do varejo e da fabricação de artigos que utilizam subprodutos bovinos como matéria-prima. A prova é que o MPF-PA vem sendo procurado por grupos nacionais e internacionais, como Carrefour, Walmart, Pão de Açúcar, Gucci, Nike e Timberland, para apresentar os esforços da pecuária paraense em alcançar patamares de sustentabilidade", afirma Daniel César Azeredo Avelino, procurador da República no Pará.
Segundo o procurador, o avanço é importante, mas as empresas poderiam se empenhar mais. "Os fornecedores da cadeia de carne ainda não são 100% rastreados por falta de boa vontade das empresas. Tecnicamente isso é viável. Atualmente há um chip que colocado no boi informa por onde ele anda, do nascimento ao abate, e custa apenas R$ 0,60", declara. Outro passo importante é o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, lançado em 2005, que reúne hoje mais de 200 empresas e organizações no combate a esse crime. "Avançou-se na melhoria da cadeia produtiva da pecuária, mas é necessário mais envolvimento do setor produtivo e das indústrias", aponta o cientista político Leonardo Sakamoto, coordenador da ONG Repórter Brasil.
DESMATAMENTO ZERO
Considerando-se que a pecuária é a maior responsável pelo desmatamento na Amazônia, o Greenpeace propôs aos frigoríficos, também no fim de 2009, um pacto denominado Desmatamento Zero. Quatro dos maiores frigoríficos do país - JBS-Friboi, Bertin, Minerva e Marfrig - o assinaram. Entre os termos do acordo estão: desmatamento zero; rejeição a situações sociais degradantes; adoção de sistema de rastreabilidade de produção; e compromisso de no máximo em cinco anos só comprar de fornecedores legalizados.
Os frigoríficos que assinaram o pacto entregaram ao Greenpeace, em 5 de julho, a lista contendo os nomes de seus fornecedores e das fazendas com os quais cortaram relações por apresentarem irregularidades.
Quando assinam pactos como esses, os frigoríficos não estão beneficiando apenas a sociedade, mas sua própria marca. De acordo com Márcio Astrini, coordenador da Campanha da Amazônia do Greenpeace, "nenhum dos elos da cadeia quer oferecer ao consumidor carne ´embalada´ com trabalho escravo ou desmatamento. Alguns já possuem o cadastramento de todos os fornecedores e podem identificá-los por satélite. Se compararem os dados que possuem com os fornecidos pelo Inpe [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais], podem saber se esses fornecedores estão desmatando ou não".
No entanto, esses avanços não garantem que a carne que chega ao prato do consumidor não tenha cometido infração ambiental ou social. Daqui para a frente o caminho é longo. "Além de políticas públicas, há três mudanças essenciais que precisam ser feitas: primeiro, valorizar práticas sustentáveis na hora da compra. Segundo, pagar preços diferentes de acordo com a qualidade do produto. Terceiro, não se limitar a cadastrar e controlar os fornecedores diretos que fazem a engorda, mas também os que criam, porque é aí que ocorre boa parte do desmatamento", enumera Roberto Smeraldi, diretor da ONG Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.
NOVOS COMPROMISSOS
O Ministério Público Federal de Mato Grosso (MPF-MT) também decidiu entrar no jogo. No início de junho, após sete meses de negociações, o Marfrig assinou acordo com o MPF-MT. Com o compromisso, o frigorífico não vai mais comprar animais vindos de fazendas embargadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ou pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, ou que façam parte da lista suja do trabalho escravo do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O JBS-Friboi, embora responda pelo maior número de abates no estado, ainda não assinou.
Apesar de apenas os frigoríficos terem sido chamados para assinar os acordos, O MPF-PA enviou aos supermercados, em maio de 2009, recomendação para que reforcem os mecanismos de controle e seleção de fornecedores com base em critérios socioambientais, além dos sanitários. Logo após, grandes redes entraram em contato com a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), solicitando medidas de controle mais efetivo junto aos fornecedores. A Abras implementou, então, o Programa Abras de Certificação da Produção Responsável na Cadeia Bovina. Porém, até o momento ele está inativo. Por meio de carta a Abras informou ao Idec que pretende implementá-lo no decorrer de 2010.
Infelizmente, os supermercados parecem estar longe de ser exemplo nessa cadeia. A pesquisa do Idec constatou que de doze redes, apenas quatro possuem Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) - Angeloni, Carrefour, Pão de Açúcar e Walmart. O contato por meio do SAC pretendia verificar se eles têm informações sobre a origem da carne que vendem e se garantem que ela não é proveniente de áreas de desmatamento. Nos supermercados que não possuem SAC a ligação foi feita para as principais lojas das redes. Os contatos feitos pelo Idec provam a dificuldade para se conseguir informações seguras sobre a origem da carne.
O que o consumidor pode fazer
Participar da campanha Mude o Consumo para Não Mudar o Clima, realizada pelo Idec em parceria com o Instituto Vitae Civilis www.climaeconsumo.org.br.
Dar preferência à carne comercializada por empresas que assinaram os acordos e que responderam à carta enviada pelo Idec pós-pesquisa, pois essas atitudes mostram comprometimento com o consumidor.
Fiscalização consumerista
Para saber o que de fato mudou depois da assinatura dos acordos, o Idec questionou os frigoríficos e supermercados a respeito de suas ações atuais e se têm planos para garantir ao consumidor que ele não está comprando produtos envolvidos em desmatamento e trabalho escravo. A intenção também era saber se os frigoríficos informam em seus sites o nome das fazendas fornecedoras de gado, conforme prevê o TAC assinado com o MPF-PA. Apenas três frigoríficos cumprem tal cláusula: Mafrinorte, Minerva e Rio Maria. O frigorífico Eldorado (Fiel) nem possui website.
Segundo Adriana Charoux, técnica do Idec e responsável pela pesquisa, "os resultados indicam que os frigoríficos e supermercados estão adotando medidas de controle socioambiental fundamentais para conhecer a origem da carne comercializada e evitar o desmatamento ilegal e o uso de trabalho escravo. Mas elas podem e devem ampliar seu compromisso social e ambiental para além do respeito à lei. Ao mesmo tempo, os governos têm o desafio de aumentar a fiscalização e atrelar a concessão de crédito à contrapartida social e ambiental das empresas tomadoras de empréstimo, já que o financiamento desse setor superou mais de R$ 22 bilhões em 2008, segundo estimativa da ONG Amigos da Terra".
Apesar dessas iniciativas, "o consumidor ainda não tem como saber se a carne que chega ao seu prato está comprometida com crimes ambientais, fundiários e trabalhistas. O discurso avança no sentido de reforçar o comprometimento das empresas, mas ainda não se concretizou", salienta Adriana. Leonardo Sakamoto reforça: "É fundamental que o produtor rural que esfola os direitos dos trabalhadores para obter lucro fácil seja diferenciado daquele que obedece a lei. O mercado e o poder público devem ajudar a criar uma economia sem trabalho escravo, e para isso precisam informar o consumidor".
Carne rastreada para poucos
Em 16 de junho chegou às prateleiras de algumas lojas do Grupo Pão de Açúcar em Brasília, Fortaleza, Rio de Janeiro e São Paulo, os primeiros lotes de carne bovina rastreada. É o programa Qualidade Desde a Origem: as carnes de terneiro e novilho da linha Taeq apresentam um selo 2D, por meio do qual o consumidor poderá conhecer toda a cadeia produtiva. As informações podem ser acessadas por meio de aplicativo presente em smartphones ou pelo site www.qualidadedesdeaorigem.com.br.
O projeto atinge 40 fazendas cadastradas, e o produtor que garantir a rastreabilidade e incorporar critérios sustentáveis conta com incentivo financeiro. Entretanto, essa carne, que é mais cara que as demais, responde por menos de 5% da venda total de carnes nas lojas do grupo.
Entre abril e maio deste ano, o Idec procurou frigoríficos e supermercados para saber qual o seu comprometimento com a qualidade ambiental e social da carne que chega à mesa dos consumidores, principalmente após a assinatura dos acordos com o MPF-PA e o Greenpeace.
Foram enviados questionários a oito frigoríficos e 12 redes de supermercados. Além disso foram feitas ligações para os SACs das redes varejistas e acessados os sites dos frigoríficos. Estes últimos foram selecionados a partir da lista dos que assinaram pelo menos um dos compromissos. A única exceção é o Independência, que estava fora de operação quando os termos foram assinados.
A pesquisa teve apoio da Oxfam Novib, por meio da Oxfam Internacional no Brasil, organização que tem como missão eliminar a pobreza e a desigualdade em todo o mundo por meio do apoio à sociedade civil organizada e a movimentos sociais que atuam nesse sentido.
As empresas se defendem
Cinco de oito frigoríficos e quatro de doze supermercados que receberam o questionário do Idec responderam. A Abras, mesmo não tendo sido questionada, encaminhou carta ao Idec.
• Frigoríficos
Frigol - Afirma que controla a origem da carne para impedir danos ambientais, crimes fundiários e trabalhistas. E que bloqueou fornecedores, como prevê o TAC assinado com o MPF-PA. Devido a problemas técnicos, o nome de seus fornecedores atuais não é informado em seu site, mas a empresa calcula que em seis meses eles sejam divulgados. Embora conheça o programa da Abras, não participa dele.
Independência - Apesar de não ter assinado nenhum dos compromissos, diz que avalia fornecedores e não mantém relações com quem comete irregularidades. Não exclui fornecedores, apenas os bloqueia até que se comprometam a eliminar as irregularidades. Mas está estudando a possibilidade de disponibilizar informações sobre os fornecedores em seu site. Não aderiu ao Programa de Certificação da Abras.
Ativo - Embora o Idec tenha encaminhado carta ao Mafrinorte, a empresa esclarece que responde em nome da Ativo Alimentos. Assinou o pacto com o MPF-PA, mas desconhece o acordo Desmatamento Zero, proposto pelo Greenpeace, e o Programa de Certificação da Abras. Informa que vem cumprindo o TAC assinado com o MPF-PA e divulga a lista de fornecedores em seu site. E, ainda, que até agora nenhum deles foi descadastrado e que antes de fechar qualquer negociação analisa as listas de embargo do Ibama e do MTE.
Marfrig Group - Não assinou o acordo com o MPF-PA, mas firmou compromisso semelhante com o MPF-MT. Informa que até o momento mapeou 80% de seus fornecedores e que pretende finalizar esse levantamento ainda este mês. E, ainda, que excluiu 108 fornecedores que constam de listas de embargo e possui sistema de controle para impedir que a matéria-prima venha de área desmatada ou que utilize trabalho escravo. Diz que não disponibiliza, em seu site, as fazendas fornecedoras, mas que está estudando a possibilidade.
Minerva - Aderiu ao pacto do Greenpeace e diz estar seguindo à risca os compromissos firmados com o MPF-PA. Firmou convênio com outros frigoríficos para monitorar imagens de satélite das propriedades fornecedoras localizadas na Amazônia. Cita em seu site um "sistema de rastreabilidade da origem do gado", que corresponde à exigência do TAC de publicar a lista de fornecedores.
• Supermercados
Carrefour - Reforça o comprometimento com o controle socioambiental e informa que em 2009 notificou os fornecedores; suspendeu a compra de produtos provenientes de fazendas ilegais no Pará; e passou a analisar diariamente as listas do Ibama e do Ministério do Trabalho e Emprego. Informa ter o programa Garantia de Origem, por meio do qual os produtos recebem um selo que atesta a origem legal a partir da rastreabilidade da cadeia de produtores e da coleta e transporte dos produtos. A carne com essa garantia é 100% rastreada e responde por 40% das vendas no açougue do grupo. Mas o supermercado não explicou com detalhes o funcionamento do sistema de rastreamento.
Comper - Informa que recebe esporadicamente mercadorias dos fornecedores que constam da lista de infratores ambientais e sociais que assinaram o TAC com o MPF-PA e o pacto Desmatamento Zero. Não controla os fornecedores, a origem, a qualidade e a legalidade da carne. E afirma que está seguro quanto ao compromisso de seus fornecedores em relação às premissas estabelecidas pelo pacto Desmatamento Zero.
Pão de Açucar - Suspendeu a compra de carne dos frigoríficos Bertin, Mafrinorte, Margen, Redenção, Minerva e Frigol até que eles assinem o pacto com o MPF-PA. Cita o programa de qualidade de carnes bovinas existente desde 2000, e informa que verifica aspectos sanitários e de transporte e realiza auditorias nos fornecedores. Entre 2006 e 2008 a empresa iniciou outro programa nas fazendas de produção das carnes Taeq, que envolve rastreabilidade, bem-estar animal, condições de trabalho e saúde, segurança dos funcionários e proteção do meio ambiente. Leia mais sobre esse programa no quadro Carne Rastreada para Poucos.
Walmart - Após receber recomendação do MPF-PA, suspendeu a compra de carne de empresas infratoras com atuação no Pará (que foi retomada quando elas assinaram o acordo), mas manteve relações comerciais com as mesmas empresas que atuam fora do estado.
• Abras
Representando 78,3 mil lojas de supermercados, informou que tem desenvolvido medidas para qualificar a carne bovina vendida em supermercados e garantir que ela não tenha relação com "práticas sociais equivocadas ou ilegais, como trabalho escravo ou infantil, desmatamento, entre outros
Veículo: Boletim IDEC
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